A fé é uma certeza e um sentimento. O símbolo é uma representação feita pelo ser humano.
Um símbolo de fé é uma imagem ou objeto. Mas aquilo que ele representa transcende a materialidade. Fica fácil entender isso, se nos vemos seres interexistentes, como dizia Herculano Pires. Seres que têm em si a existência material e a espiritual entrelaçadas. Manifestamos nossa animalidade e nosso potencial de angelitude, na síntese da nossa encarnação terrena. Mas espiritualidade e materialidade estarem entrelaçadas não significa que estejam confundidas.
Confundir o símbolo com a fé é um sinal de incompreensão do objetivo da fé e da conexão espiritual, que é feita com uma realidade e, não, com a sua representação. Mas as pessoas se sentem atacadas e ofendidas na sua fé, quando seus símbolos são subvertidos. E isto precisa ser compreendido como característica de nosso modo de pensar e de funcionar socialmente.
Entendo que a fé não precisa ser defendida, mas vivenciada. E nós a vivenciamos tanto quanto materializamos em nossos atos, os sentimentos e valores que trazemos em nós. Por isso, não devo supor que o próximo pensa como eu, que valoriza o que valorizo, seja por ignorância ou por acreditar em algo diferente. Mas o próximo precisa de compreensão e perdão, não de ódio e violência. As pessoas precisam de diálogo, não de condenação.
Fanatismo e radicalismo são contrários ao bom senso e à razão. E é muito fácil ser irracional, nessas horas, de modo que a intolerância pode atingir níveis extremos, como no caso da invasão e atentado à redação do jornal satírico Charlie Hebdo, em Paris, em janeiro, por radicais muçulmanos. O jornal publicava charges consideradas ofensivas por eles.
Uma consequência disso tudo é que, no geral, é bom respeitar a fé e os símbolos do próximo, além de conservar os dentes. Outra consequência é que o símbolo, usado de forma não aceita, é apenas um aspecto material e não fere a essência de uma doutrina, nem a fé. É uma expressão de um pensamento discordante da maioria, como a de Viviany Beleboni, que saiu na Parada Gay seminua e crucificada e, agora, vem sendo ameaçada por internet e telefone.
A cruz, basicamente, era um instrumento de suplício. A crucificação era uma punição romana. Já os judeus puniam com apedrejamento. E qual seria, então, nosso direito e nossa forma de punir os discordantes? Estariam, esse direito e essa forma, de acordo com o amor, respeito e perdão que pregamos?
O uso do símbolo – considerado indevido – não atinge, ou não deveria atingir nossa fé e nossos melhores sentimentos cristãos, budistas, islamitas, hinduístas, que são exercitados mediante compaixão e não, pela via da altercação, ameaça ou da agressividade física.
Olá Rita.
Bom, como sempre, sua abordagem, com destaque para aquele toque de equilíbrio firmado no bom senso. Eu acrescentaria duas coisas: 1) aquilo que você chama de representação humana talvez ficasse melhor se dissesse “representação feita pelo ser humano”, já que o símbolo existe a partir de um consenso entre ele e o seu significado numa dada sociedade; 2) entendo que a interexistencialidade defendida por Herculano Pires está centrada na ideia da convivência natural e cotidiana dos encarnados com os desencarnados, da qual ambos se beneficiam em termos de experiências na estrada da evolução. Grande abraço.
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Wilson, agradeço pelas suas palavras. Gostei da sua observação, que deixa mais clara a ideia da representação no símbolo. Vou alterar o texto.
Quanto à interexistencialidade: bom, a convivência com os desencarnados é uma consequência da nossa própria condição interexistente. Meio “à la Descartes”, gosto de pensá-la primeiro dentro de mim e em como ela afeta meu modo de lidar com as coisas, os conceitos e a vida… Abraço fraternal!
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